Memória Cinematográfica

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A Pele que Habito

Estreia Europeu 3 novembro 2011

O cineasta espanhol Pedro Almodóvar é daqueles autores que, sempre quando lança um filme, cria expectativas em seu público. Isso porque, a cada lançamento (o último foi “Abraços Partidos“, em 2009), os cinéfilos de plantão têm certeza que mais uma grande obra poderá ser vista no cinema, sobretudo porque ele leva a transgressão a sério. Não tem pudor de exibir envolvimentos amorosos homossexuais, problemas familiares, mulheres à beira da loucura, sempre com o bom humor, digamos, “almodovariano”.

Nesta sexta-feira, 4, estreia “A Pele que Habito” (“La Piel que Habito”), cujo protagonista é vivido por Antonio Banderas, ator espanhol que, aliás, foi revelado ao mundo pelo próprio cineasta, e o longa-metragem traz de volta a parceria.

A trama, cujo roteiro foi escrito pelo diretor, ao lado de seu irmão Agustín e baseado no texto “Mygale”, de Thierry Jonquet, não pode ser muito comentada, ou estragaria a surpresa do espectador. No entanto, vamos ao básico.

Banderas é Robert Ledgard, um cirurgião plástico que vive à sombra da morte da esposa, que morreu queimada em um acidente de carro. Por conta desta tragédia, ele começou a pesquisar a fim de criar uma nova pele com a qual ele poderia tê-la salvo, ou seja, uma pele sensível ao toque, mas que impede queimaduras. E esse feito ele só conseguiu muitos anos depois, em seu laboratório, que fica escondido, já que ele costuma praticar cirurgias nada ortodoxas.

A verdade sobre o que faz uma mulher, Vera (Elena Anaya), dentro de sua casa, vigiada por câmeras de todos os lados, e que só recebe alimento pela porta e conversa com a carcereira Marilia (Marisa Paredes, ótima!) por interfone, vai sendo revelada ao longo da projeção. Assim como faz a conexão com a história de sua filha, que aparece durante uma festa.

Vera, aliás, está sempre vestida com uma roupa que parece ser a segunda pele. E só usa essa enquanto fica trancada no quarto, podendo ser observada pelas câmeras enquanto realiza posições de ioga que aprendera com ajuda de um livro. Nesta casa, há muitos quadros sensuais nas paredes e de mulheres nuas, destacando a pele, principalmente.

Embora nos filmes de Almodóvar as cores berrantes sejam predominantes, em “A Pele que Habito” ele preferiu algo mais sóbrio, cinza, até porque condiz com a tensão que o filme produz no espectador. O figurino, de Paco Delgado, tem a colaboração do estilista Jean-Paul Gaultier. E a tensão é endossada pela música.

Assim como em “Má Educação” e “Volver”, o desejo é uma das marcas desta fita, principalmente aquele não correspondido, o que leva ao oposto, à violência sexual. E é a família que está em primeiro plano, ainda que não seja um modelo ideal. Para coroar a obra típica do autor, mais uma vez ele toca em sexualidade, sobretudo em mudança de sexo, tal como já falou em “Tudo Sobre Minha Mãe”, ainda que o foco seja completamente outro.

Como o próprio Pedro Almodóvar disse no material de divulgação para a imprensa, neste filme a protagonista pega um caminho sem volta, mesmo contra sua vontade, e sua “trajetória kafkaniana resulta da sentença proferida por um júri formado por uma única pessoa, seu pior inimigo”.

Também fazem parte de suas inspirações os diretores Luis Buñel, Alfred Hitchcock, além de filmes de Fritz Lang (dos góticos aos noir). Há ainda referências óbvias de “Frankenstein”, de James Whale.

“A Pele que Habito” é uma história tensa, densa e que trata de vingança, além de falar de identidade e invulnerabilidade, sem se esquecer do toque de humor sarcástico, que apimenta os diálogos, sempre bem construídos. Uma verdadeira obra-prima com assinatura de quem sabe sobre o que está falando.

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